O Tanque do Povo
Quando entrei na escola fui repreendido algumas vezes, pelas minhas professoras, por que sempre me dirigia às lagoas como tanques! O interessante é como incorporei o vocabulário e nunca deixei de usá-lo.
Quando criança, minha mãe sempre me levava para a feira. Não lembro a primeira feira que fui e certamente devo ter ido à feira muito antes das lembranças que tenho do que é uma feira (quando nasci meu pai e minha mãe já vendiam na feira).
A primeira lembrança que tenho da feira (em Itabaiana - SE) foi em uma época de São João. No período de festas juninas sempre colocávamos uma banca (barraca) para venda de fogos de São João (Fogos de Artifício). Os fogos eram meu próprio pai quem os fabricava. Naquela época as barracas de fogos eram colocadas em frente a antiga Casa de Força (onde ficava a termelétrica que gerava energia para a cidade). Não sabia que era uma casa de força pelo motivo das pessoas nunca informarem, nem mesmo na escola, e o termo termelétrica só fui ter conhecimento de quando já estava estudando na universidade!
Durante o início da feira, minha mãe se distraiu, aproveite para matar a curiosidade explorando os arredores de onde estávamos vendendo os fogos de artifício. Primeiramente fiquei conhecendo o Sanitário Público (uma verdadeira fedentina bem em frente a feira de vender fatos) e logo depois me surpreendi com a enorme lagoa que ficava ao lado do sanitário público. Curiosamente, nesta época, a Câmara de Vereadores ficava no andar superior do Sanitário Público!!! Claro que só fiquei sabendo deste detalhe alguns anos depois, mas fiquei surpreso quando soube que no inusitado local foram colocados os nossos representantes municipais!
Quando minha mãe percebeu o que estava acontecendo, gritou de longe: pelo amor de Deus! Segura esse menino? O desespero da minha mãe é que já tinha descido às escadas que davam acesso a água, da lagoa, e estava em pé em um dos degraus que ficava dentro d’água. Nesta época o tanque ainda tinha o muro intacto, escadarias de acesso à água, iluminação, a água não tinha poluição química e a população ainda não depositava lixo em seu interior.
Essa grande lagoa era nada mais nada menos que o Tanque do Povo e onde hoje fica o Mercadão. Nesta época a água era utilizada, pelos feirantes (a feira fica bem em frente à lagoa), para se limpar as bancas e o chão da feira. Podia se perceber a existência de alguns peixes (piabas) nos locais mais rasos. Mas já estava um pouco poluída, degrada pelo vandalismo, pela falta de conservação por parte do poder público e comunidade local.
Foto conseguida no Grupo Itabaiana Grande (facebook) onde mostra o Tanque do Povo já um pouco degradado e o Mercadão que foi construído no local |
A degradação propriamente dita, deste tanque (lagoa), começou quando a funcionar na parte alta da cidade: postos de venda de combustível, postos de lavagem de carros e oficinas de manutenção de automotivos. Muitas dessas oficinas e postos faziam a troca de óleo de motor dos carros jogando no esgoto (a céu aberto), que descia a Avenida Antônio Dória e desaguava dentro do Tanque do Povo. Isso foi o grande motivo e matança do lago. Alias é bom que se diga, esse procedimento foi o grande motivo da morte do Tanque do Povo e o principal motivo da poluição do chamado Açude Novo (Açude da Macela). Quando esse tanque sangrava (dava vazão), as águas percorriam um canal coberto por debaixo das casas, atravessando a Rua do Quartel, atravessava a Rua Nova, saia na Rua da Lavanderia Pública e depois percorria um bom trecho, por dentro dos sítios, até desaguar no Açude Novo, e desaguava entre as propriedades do Sr. Corró e do Sr. Artur.
Quando ainda garoto, aproveitava o sangradouro deste tanque e conseguia pegar muitas piabas utilizando um jereré. Com a poluição da lagoa, principalmente com óleo automotivo, os peixes sumiram. Enquanto a poluição era feita com esgotos domésticos, os peixes ainda conseguiam sobreviver. É bom deixar claro que naquela época os esgotos domésticos não tinham quase nenhum material químico, era composto quase que totalmente com material orgânico e esse material orgânico servia de alimentação para alguns peixes (o corró é o caboje eram alguns deles).
Com o decorrer do tempo, os moradores locais e feirantes passaram a depositar o lixo dentro desta lagoa, o muro passou a ser derrubando gradativamente e os postes de energia foram todos arrancados.
Com o crescimento da feira local, as barracas de fogos foram transferidas, colocadas na calçada bem em frente ao Tanque do Povo e de frente com a feira. Posteriormente a feira dos fogos foi transferida para calçada deste mesmo tanque, só que do lado de frente onde ficavam as residências
No local, onde existia esta lagoa, foi construído o atual Mercadão e para dar vazão dos esgotos provenientes dos postos de gasolina foi construído um canal que passa por sob a nova construção, foi conectando ao antigo canal que já existia e que dava vazão a lagoa. Sobre a existência, do Tanque do Povo, só restaram lembranças em algumas fotografias guardadas por pessoas daquela época!
Muitas histórias ainda são contadas a respeito desta lagoa. Segundo os antigos moradores da localidade, , quando da prisão de algumas pessoas, o chefe político local costuma obrigar alguns presos (os desafetos políticos) retirarem água, deste tanque, para abastecer a caixa d’água da delegacia local que fica a alguns metros de distância. O problema é que o prisioneiro era obrigado a encher a caixa utilizando uma lata furada! Na realidade era uma forma de torturar o inimigo político!
Foto conseguida no Grupo Itabaiana Grande onde mostra alguns moradores da época com o Tanque do Povo ao fundo. É possível ver a antiga Delegacia de Polícia no outro lado da lagoa |
Outra história, que ainda é comumente contada pelos antigos moradores da época, é que algumas pessoas saiam a vender água, desta lagoa, para a comunidade (década de 50 do século XX). Existiam boatos que o chefe político da época teria colocado um jacaré para viver na lagoa a fim de impedir que pessoas se banhassem nas águas e assim conseguir manter a água limpa! Na realidade o tanque servia para abastecimento de algumas necessidades da população que ainda não contava com serviço de água encanada. Desses vendedores, que eu cheguei a conhecer, tinha o apelido da “carboreto”, mas não alcancei a época que o mesmo saia a vender água pelas ruas da cidade.
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