Aprovação do documento também vem na esteira das mudanças pretendidas pela Reforma do Ensino Médio. MEC precisa homologar o documento
ANA LUIZA BASILIO , 4 de dezembro de 2018
O Conselho Nacional de Educação (CNE) aprovou na terça-feira 4 a Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Médio. A votação contou com a participação de 20 conselheiros, 18 deram votos favoráveis ao documento e dois se abstiveram.
Com caráter normativo, a BNCC não precisa passar por votação no Congresso, nem sanção presidencial, o que significa que suas normas passam a valer de imediato. Apenas o MEC precisa homologar o documento, o que deve ocorrer no próximo dia 14.
A aprovação do documento sofreu forte pressão popular que, inclusive, levou ao cancelamento de algumas audiências públicas pelo País. Entidades e instituições da educação, professores, estudantes e ativistas consideram não democrática a construção do documento, à luz da aprovação da Reforma do Ensino Médio, política articulada à BNCC.
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A aprovação acontece quase um ano após a aprovação da Base Nacional para os Ensino Infantil e Fundamental, medida que, segundo especialistas, promove uma cisão na Educação Básica.
As críticas ao documento giram em torno da proposta de “enxugamento do currículo”, com a definição de que 60% da carga horária da etapa, ou seja 1800 horas sejam dedicadas aos conteúdos da Base. Os outros 40% da etapa podem ser cumpridos via itinerários formativos, medida prevista na Reforma da etapa, e que, segundo os especialistas, pode não só comprometer a qualidade da educação dos estudantes, como abrir um precedente para a atuação de interesses privados, com propostas de educação a distância, que prejudiquem também a carreira docente.
Este mês o Ministério da Educação aprovou, no âmbito das Novas Diretrizes Curriculares do Ensino Médio, o uso da EAD na etapa. Com isso, é possível que até 20% da carga horária do curso diurno seja ofertada via EAD, 30% do curso noturno e 80% da EJA, direcionada a jovens e adultos que não se formaram no tempo regular na escola.
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Para o ex-presidente da Comissão da BNCC, César Callegari, que renunciou ao cargo em julho por discordâncias políticas em relação à BNCC e à Reforma do Ensino Médio, isso significa “reduzir os direitos de aprendizagem”. “Quem pode e quer, educa. Quem não pode, a maioria, fará o que pode e não o que é necessário”, referindo-se à capacidade técnica e orçamentária dos Estados.
Outro ponto crítico da BNCC, segundo especialistas, é o fato de somente as disciplinas de Português e Matemática terem carga obrigatória nos três anos da etapa. Os demais conhecimentos podem ser distribuídos ao longo do período, em um ano, dois ou três. Callegari também vê com preocupação a medida. “Se dilui as disciplinas em áreas, sem que se diga o que deve ser assegurado”, questiona.
Mais radical à proposta, o professor da Universidade Federal do ABC, Fernando Cássio, questiona a ideia de que, a partir da Base, com um currículo centralizado, é possível mitigar desigualdades educacionais e garantir os direitos de aprendizagem. O especialista reflete sobre a questão no artigo “Base Nacional Comum e a defesa da centralização curricular nas candidaturas ao Planalto”, publicado pelo Carta Educação ainda antes das eleições.
“A maior parte das críticas à BNCC presentes no debate público passa longe do cerne do problema: a própria ideia de centralização e homogeneização curricular”, reflete o especialista. Cássio explica que, educação não é aprendizagem. “O “direito à educação”, que deve ser garantido pelo Estado, é muito diferente de um juridicamente maldefinido “direito de aprendizagem”. Quando a linguagem da educação é substituída pela da aprendizagem, aquilo que é projeto coletivo (a educação) vira um projeto eminentemente individual (a aprendizagem). A BNCC e o seu linguajar “aprendificado” – termo de Gert Biesta, filósofo da educação – dão forma a um projeto de educação ultraliberal em que a própria educação, como projeto coletivo que é, se vê ameaçada.
Ainda não se tem certeza de como o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) vai lidar com o tema mas, desde a candidatura, ele não se mostrou contra a padronização curricular, associando “estranhamente” a Base, na análise de Cássio, a mecanismos de aprovação automática e a disciplina nas escolas.
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