A melhoria da situação dos 10% mais ricos no Brasil na última década não contrasta com a melhoria da distribuição total da renda no mesmo período.
José Carlos Peliano (*)
Olhar a distribuição de renda de qualquer país traz sempre o viés de captar o quão desigual ela pode ser, o tamanho do que cada um ganha e quais as participações na renda que conseguem alcançar. Acaba sendo, na maioria das vezes, um retrato da pobreza, mais que uma visão geral de como está o perfil total da renda.
Não que este olhar seja equivocado ou mal visto. Nada disso. Em países pobres ou em desenvolvimento, onde a pobreza se concentra mais, olhar esta situação ajuda a convencer os formuladores de política e os empresários, banqueiros e capitalistas em geral, que se nada for feito, o barco tende a afundar. Se é que já não deva estar fazendo água.
A situação da renda no Brasil, por exemplo, tem sido comentada por muitos. Inclusive, aqui na Carta, alguns textos, inclusive meus de meses atrás, abordaram o assunto. O país ainda mantém um alto grau de desigualdade, onde se situam poucos ricos de um lado e muitas vezes mais pobres de outro, apesar da conquista da última década em reduzi-la significativamente.
Ao virar a visão para o lado de cima, porém, onde estão os mais ricos na distribuição, permite ver o mesmo resultado da desigualdade, mas identifica a quantidade deles, o quanto abocanham do bolo geral da sociedade e, até mesmo, facilita a comparação da situação de sua riqueza com aquelas dos ricos de outros países.
Não dá para comparar pelos números frios das estatísticas, entretanto, o quanto cabe a ricos e a pobres em relação a muita situações que encontramos em nossa sociedade. Basta olhar, por exemplo, aqueles que vivem de resgatar restos nos inúmeros lixões regiões afora com outros que se sentam em monumentais escritórios da Avenida Paulista.
Ou todos aqueles que acordam de madrugada para pegar 2 ou 3 conduções, levando de 2 a 3 horas para chegar cedo ao trabalho, e o mesmo tempo de volta já à noite, em comparação àqueles que podem e tem tempo para estudar nas melhores escolas e faculdades do país. Os primeiros pouco ou nada mais esperam do trabalho, os segundos diploma, anel no dedo e propriedade de escritórios ou consultórios ou assemelhados.
Sim, a realidade econômica e social é desigual, não por natureza, mas pela evolução da história, ao tomar o rumo capitalista. Mais desigual ainda, no entanto, é a frieza, o preconceito e o desdém de muitos que veem nos pobres um estorvo, uma malandragem, um desperdício.
Equipara-se essa postura injuriosa, à discriminação racial que muitos brasileiros ainda praticam contra outros irmãos de origem e miscigenação. Distratar um pobre dá no mesmo que discriminar um brasileiro de cor, seja ela qual for. Ninguém é mais que ninguém, está aí o fim da vida de cada um para mostrar a todos dia após dia.
A pobreza de espírito dos discriminantes não chega aos pés do espírito dos discriminados, sejam eles pobres ou de cor. Quem se acha muito tem se comparar, se quiser, com quem se acha mais ainda. Não com os demais que não acham nada porque discriminados de nascença pela falta de oportunidades que tiveram ou seus pais.
De volta, no entanto, à situação de renda. Dados obtidos do site World Top Incomes Database, que utiliza as informações obtidas por Thomas Piketty e outros, permitem fazer a comparação de resultados das distribuições de renda dos Estados Unidos e China. Os dados do Brasil foram obtidos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).
A ideia original era de comparar os dados referentes aos países integrantes dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), no entanto não houve possibilidade de obtê-los tendo em vista que o site ainda está em construção. Mesmo assim, os dados da China, só podem ser parcialmente usados.
Tendo em conta a participação na renda total no ano 2000 dos 10% mais ricos, ou melhor, o quanto eles abocanharam do bolo geral de renda na sociedade, os resultados mostram que na China atingiu 25,5%, nos Estados Unidos 43,1% e no Brasil 47,5%. As diferenças de levantamento nos três países não prejudicam a comparação tendo em vista a distância entre os percentuais encontrados.
Observa-se que a décima parte mais rica do Brasil teve em 2000 praticamente a metade do bolo gerado, os Estados Unidos um pouco menos e a China quase a metade ou um pouco mais do pedaço brasileiro.
Desses três resultados dá para concluir que, de fato, o regime chinês é menos desigual que o capitalismo praticado nos Estados Unidos e no Brasil. O que mostra que, apesar do nível de vida mais baixo da maioria na sociedade chinesa, a riqueza do país é melhor distribuída.
As séries de dados dos três países não são homogêneas. A da China para em 2003, cujo resultado é 28%. Brasil e Estados Unidos chegam até 2010 com os percentuais de 49,4% e 46,4% respectivamente.
Os mais ricos ficaram ainda mais ricos nos três países, a China um pouco mais em menor tempo que Estados Unidos e Brasil. A entrada da China na economia de mercado vem levando ao mesmo rumo dos países capitalistas mais consolidados.
Isto indicaria que aquele país chegará próximo aos mesmos percentuais de Brasil e Estados Unidos? Só o tempo dirá, embora, com certeza haverá correção de rumo uma vez que o regime de governo de lá está alavancado em maior controle estatal e com a maior população do mundo.
A melhoria da situação dos 10% mais ricos no Brasil na última década não contrasta com a melhoria da distribuição total da renda no mesmo período. A melhoria foi obtida com a abertura de novas oportunidades de trabalho, emprego e renda para os brasileiros que estavam ou fora do mercado, ou em ocupações de baixos rendimentos. Os programas sociais do governo tiveram a maior parcela do resultado.
Propostas dos novos candidatos à Presidência como interrupção do Pré-Sal, menores reajustes do salário mínimo, venda da Petrobras, Banco Central independente, maior abertura ao capital estrangeiro da riqueza e do patrimônio nacional, todas elas, terão consequências desastrosas sobre a distribuição da renda e o bem-estar geral.
Aumento do número de ricos, aumento do número de pobres, piora da desigualdade de rendas e retrocesso nos avanços até aqui conseguidos na política social, econômica, ambiental e patrimonialista. O Brasil está pronto para iso? É isto que queremos?
Não que este olhar seja equivocado ou mal visto. Nada disso. Em países pobres ou em desenvolvimento, onde a pobreza se concentra mais, olhar esta situação ajuda a convencer os formuladores de política e os empresários, banqueiros e capitalistas em geral, que se nada for feito, o barco tende a afundar. Se é que já não deva estar fazendo água.
A situação da renda no Brasil, por exemplo, tem sido comentada por muitos. Inclusive, aqui na Carta, alguns textos, inclusive meus de meses atrás, abordaram o assunto. O país ainda mantém um alto grau de desigualdade, onde se situam poucos ricos de um lado e muitas vezes mais pobres de outro, apesar da conquista da última década em reduzi-la significativamente.
Ao virar a visão para o lado de cima, porém, onde estão os mais ricos na distribuição, permite ver o mesmo resultado da desigualdade, mas identifica a quantidade deles, o quanto abocanham do bolo geral da sociedade e, até mesmo, facilita a comparação da situação de sua riqueza com aquelas dos ricos de outros países.
Não dá para comparar pelos números frios das estatísticas, entretanto, o quanto cabe a ricos e a pobres em relação a muita situações que encontramos em nossa sociedade. Basta olhar, por exemplo, aqueles que vivem de resgatar restos nos inúmeros lixões regiões afora com outros que se sentam em monumentais escritórios da Avenida Paulista.
Ou todos aqueles que acordam de madrugada para pegar 2 ou 3 conduções, levando de 2 a 3 horas para chegar cedo ao trabalho, e o mesmo tempo de volta já à noite, em comparação àqueles que podem e tem tempo para estudar nas melhores escolas e faculdades do país. Os primeiros pouco ou nada mais esperam do trabalho, os segundos diploma, anel no dedo e propriedade de escritórios ou consultórios ou assemelhados.
Sim, a realidade econômica e social é desigual, não por natureza, mas pela evolução da história, ao tomar o rumo capitalista. Mais desigual ainda, no entanto, é a frieza, o preconceito e o desdém de muitos que veem nos pobres um estorvo, uma malandragem, um desperdício.
Equipara-se essa postura injuriosa, à discriminação racial que muitos brasileiros ainda praticam contra outros irmãos de origem e miscigenação. Distratar um pobre dá no mesmo que discriminar um brasileiro de cor, seja ela qual for. Ninguém é mais que ninguém, está aí o fim da vida de cada um para mostrar a todos dia após dia.
A pobreza de espírito dos discriminantes não chega aos pés do espírito dos discriminados, sejam eles pobres ou de cor. Quem se acha muito tem se comparar, se quiser, com quem se acha mais ainda. Não com os demais que não acham nada porque discriminados de nascença pela falta de oportunidades que tiveram ou seus pais.
De volta, no entanto, à situação de renda. Dados obtidos do site World Top Incomes Database, que utiliza as informações obtidas por Thomas Piketty e outros, permitem fazer a comparação de resultados das distribuições de renda dos Estados Unidos e China. Os dados do Brasil foram obtidos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).
A ideia original era de comparar os dados referentes aos países integrantes dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), no entanto não houve possibilidade de obtê-los tendo em vista que o site ainda está em construção. Mesmo assim, os dados da China, só podem ser parcialmente usados.
Tendo em conta a participação na renda total no ano 2000 dos 10% mais ricos, ou melhor, o quanto eles abocanharam do bolo geral de renda na sociedade, os resultados mostram que na China atingiu 25,5%, nos Estados Unidos 43,1% e no Brasil 47,5%. As diferenças de levantamento nos três países não prejudicam a comparação tendo em vista a distância entre os percentuais encontrados.
Observa-se que a décima parte mais rica do Brasil teve em 2000 praticamente a metade do bolo gerado, os Estados Unidos um pouco menos e a China quase a metade ou um pouco mais do pedaço brasileiro.
Desses três resultados dá para concluir que, de fato, o regime chinês é menos desigual que o capitalismo praticado nos Estados Unidos e no Brasil. O que mostra que, apesar do nível de vida mais baixo da maioria na sociedade chinesa, a riqueza do país é melhor distribuída.
As séries de dados dos três países não são homogêneas. A da China para em 2003, cujo resultado é 28%. Brasil e Estados Unidos chegam até 2010 com os percentuais de 49,4% e 46,4% respectivamente.
Os mais ricos ficaram ainda mais ricos nos três países, a China um pouco mais em menor tempo que Estados Unidos e Brasil. A entrada da China na economia de mercado vem levando ao mesmo rumo dos países capitalistas mais consolidados.
Isto indicaria que aquele país chegará próximo aos mesmos percentuais de Brasil e Estados Unidos? Só o tempo dirá, embora, com certeza haverá correção de rumo uma vez que o regime de governo de lá está alavancado em maior controle estatal e com a maior população do mundo.
A melhoria da situação dos 10% mais ricos no Brasil na última década não contrasta com a melhoria da distribuição total da renda no mesmo período. A melhoria foi obtida com a abertura de novas oportunidades de trabalho, emprego e renda para os brasileiros que estavam ou fora do mercado, ou em ocupações de baixos rendimentos. Os programas sociais do governo tiveram a maior parcela do resultado.
Propostas dos novos candidatos à Presidência como interrupção do Pré-Sal, menores reajustes do salário mínimo, venda da Petrobras, Banco Central independente, maior abertura ao capital estrangeiro da riqueza e do patrimônio nacional, todas elas, terão consequências desastrosas sobre a distribuição da renda e o bem-estar geral.
Aumento do número de ricos, aumento do número de pobres, piora da desigualdade de rendas e retrocesso nos avanços até aqui conseguidos na política social, econômica, ambiental e patrimonialista. O Brasil está pronto para iso? É isto que queremos?
Texto original: CARTA MAIOR
Nenhum comentário:
Postar um comentário