(JB)- Podemos imaginar o sofrimento das famílias espanholas, com a perda de mais de 80 pessoas no acidente de Santiago de Compostela. Ele é ainda maior, quando se sabe que o responsável direto pelo acidente, segundo sua própria confissão, foi o condutor do trem. A composição descarrilhou no último trecho do trem de alta velocidade, da linha Madri-El Ferrol, explorada pela Renfe, empresa estatal espanhola.
Quando se cogitou de construir uma linha de altíssima velocidade, ligando o Rio a São Paulo e a Campinas, não faltaram advertências de bom senso. Esses trens são interessantes em trechos médios e curtos, em países bem menores do que o nosso, e onde já existam linhas convencionais confortáveis, eletrificadas e inteligentes, acessíveis à maioria da população. A construção de longos trechos só é justificada em países como a China, que dispõem de bilhões, para investir no que quiserem, e que não fazem isso por meio de empresas estrangeiras.
Não é esse o nosso caso. As nossas ferrovias se encontram sucateadas, e as empresas concessionárias só se interessam em conservar e ampliar os trechos que lhes garantem lucros fabulosos, com foco no transporte de carga, er não de passageiros. É muito mais importante, por isso mesmo, empregar todo o dinheiro possível na construção de novas linhas, destinadas a transporte de passageiros, em velocidade razoável e em condições ideais de segurança. Ora, segundo as informações divulgadas pelo próprio governo, pretende-se uma velocidade média de 350 km/hora, ainda não atingido em qualquer outra obra do gênero. O custo já está calculado em 38 bilhões, e pode crescer ainda mais. Com esse dinheiro é possível duplicar a malha ferroviária nacional, que é hoje de 28.000 km, retificando o leito de muitas delas e eletrificando outras.
No trecho São Paulo-Rio, seria possível a aquisição de vagões-leito de grande conforto, que permitisse ao viajante passar a noite dormindo, e chegar descansado ao destino – depois de uma ducha no próprio compartimento. É uma boa alternativa ao transporte aéreo de pequeno curso, que exige do passageiro algumas horas, além do vôo em si: duas para chegar com 1 hora de antecedência ao aeroporto e, no destino, pelo menos mais uma hora depois do desembarque, para chegar à cidade.
Não se sabe bem por quê, o Ministro Paulo Bernardo decidiu convidar as empresas espanholas para constituir o consórcio para a construção e exploração do nosso trem de alta velocidade. Foi assim que a Renfe – a estatal que monopoliza o sistema ferroviário espanhol – se aliou às empresas estatais Adif – Administradora de Infraestruturas, e Ineco, engenharia e economia de transportes – para disputar, como favorita, segundo a imprensa daquele país, a licitação marcada para 16 de agosto.
Tampouco não se sabe por quê o edital de licitação, divulgado pelo governo brasileiro, faz uma curiosa exigência, a de que a empresa licitante não tenha sofrido, em suas linhas de alta velocidade, um acidente nos últimos cinco anos, o que excluiria em princípio a China, onde está a maior rede de alta velocidade do mundo. O desastre de Santiago de Compostela inviabiliza, liminarmente, a Renfe. É interessante registrar essa cláusula do edital, já que, como mostram o caso da China e da própria Espanha, é impossível impedir acidentes, em trens de qualquer velocidade, como acontece também em outras modalidades de transporte, como o aéreo, por exemplo.
E, ainda que fosse importante a adoção do trem-bala, já temos em andamento uma tecnologia em princípio muito mais avançada do que a espanhola – que na verdade é alemã e francesa – que é a de levitação magnética, que está sendo testada no Rio de Janeiro pela Coppe, da UFRJ (foto). Embora baseada em experiências anteriores, o projeto brasileiro avança em sua tecnologia, prevista para ser aplicada primeiro em transporte urbano, mas que também serve para médias e longas distâncias, com a vantagem de permitir graus de inclinação na linha que são inalcançáveis para os trens-bala atuais.
Texto retirado do blog de MAURO SANTAYANA
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