Publicado na BBC Brasil.
Quase todas as ruas em quase todas as grandes cidades do mundo estão lotadas de pessoas usando seus celulares, alheias à presença dos outros. É um comportamento que não existia poucas décadas atrás.
Acabamos nos acostumando ao fato de que compartilhar o mesmo espaço físico não significa mais compartilhar da mesma experiência. Onde quer que estejamos, levamos conosco opções muito mais interessantes do que o lugar e o momento que vivemos: amigos, familiares, notícias, imagens, modismos, trabalho e lazer cabem na palma da mão.
Mas como questiona o fotógrafo Josh Pulman, autor do ensaio Somewhere Else (em algum outro lugar, em tradução livre), cujas fotos são exibidas com esta reportagem: “Se duas pessoas estão andando juntas, cada uma prestando atenção a seu telefone, elas estão realmente juntas?”
Faz parte do ser humano ter uma profunda vontade de se conectar. Mas será que esse dom pode nos prejudicar em algum momento? É possível ficar “conectado em excesso”? E o que isso significa para nosso futuro?
A vida por um fio
Desde sua invenção, o telefone tem sido um motor de agitação social e um foco de ansiedade tecnológica. Imagine a cena através dos olhos do século 19, quando as primeiras estruturas de telefonia começaram a ser instaladas: quilômetros e quilômetros de fios pendurados nas laterais das ruas, perfurando todas as casas. As paredes estavam sendo violadas: o santo lar, ligado a uma nova espécie de interação humana.
“Em breve não seremos mais do que gelatinas transparentes”, lamentou um jornalista britânico em 1897, temendo a perda da privacidade.
Mas, enquanto os primeiros medos em relação ao telefone podem ter sido exagerados, eles também foram um tanto proféticos. Se no fim do século 19 e durante o século 20 nossa vontade foi de plugar todos os locais de trabalho e lazer em redes, o século 21 emerge com o desejo de uma interconexão de nossas mentes nessa trama.
E estamos começando a sentir os efeitos disso.
Assim como seu antepassado no século 19, o telefone celular nasceu como um símbolo de status para as pessoas afluentes e ocupadas. Com o tempo, o luxo se tornou universal. Passamos a entremear a disponibilidade constante no nosso conceito de espaço público e privado, na nossa linguagem corporal e na etiqueta cotidiana.
Ficar incontactável se tornou a exceção, algo fora deste mundo – mas também uma fonte inesgotável de ansiedades.
E, como a história se repete, a todo momento recebemos alertas sobre possíveis efeitos prejudiciais da comunicação móvel.
Um desses avisos veio com a notícia de que um homem de 31 anos foi recentemente internado para se tratar de um “distúrbio de vício em internet”, por causa de seu uso excessivo do smartphone.
Quase todas as ruas em quase todas as grandes cidades do mundo estão lotadas de pessoas usando seus celulares, alheias à presença dos outros. É um comportamento que não existia poucas décadas atrás.
Acabamos nos acostumando ao fato de que compartilhar o mesmo espaço físico não significa mais compartilhar da mesma experiência. Onde quer que estejamos, levamos conosco opções muito mais interessantes do que o lugar e o momento que vivemos: amigos, familiares, notícias, imagens, modismos, trabalho e lazer cabem na palma da mão.
Mas como questiona o fotógrafo Josh Pulman, autor do ensaio Somewhere Else (em algum outro lugar, em tradução livre), cujas fotos são exibidas com esta reportagem: “Se duas pessoas estão andando juntas, cada uma prestando atenção a seu telefone, elas estão realmente juntas?”
Faz parte do ser humano ter uma profunda vontade de se conectar. Mas será que esse dom pode nos prejudicar em algum momento? É possível ficar “conectado em excesso”? E o que isso significa para nosso futuro?
A vida por um fio
Desde sua invenção, o telefone tem sido um motor de agitação social e um foco de ansiedade tecnológica. Imagine a cena através dos olhos do século 19, quando as primeiras estruturas de telefonia começaram a ser instaladas: quilômetros e quilômetros de fios pendurados nas laterais das ruas, perfurando todas as casas. As paredes estavam sendo violadas: o santo lar, ligado a uma nova espécie de interação humana.
“Em breve não seremos mais do que gelatinas transparentes”, lamentou um jornalista britânico em 1897, temendo a perda da privacidade.
Mas, enquanto os primeiros medos em relação ao telefone podem ter sido exagerados, eles também foram um tanto proféticos. Se no fim do século 19 e durante o século 20 nossa vontade foi de plugar todos os locais de trabalho e lazer em redes, o século 21 emerge com o desejo de uma interconexão de nossas mentes nessa trama.
E estamos começando a sentir os efeitos disso.
Assim como seu antepassado no século 19, o telefone celular nasceu como um símbolo de status para as pessoas afluentes e ocupadas. Com o tempo, o luxo se tornou universal. Passamos a entremear a disponibilidade constante no nosso conceito de espaço público e privado, na nossa linguagem corporal e na etiqueta cotidiana.
Ficar incontactável se tornou a exceção, algo fora deste mundo – mas também uma fonte inesgotável de ansiedades.
E, como a história se repete, a todo momento recebemos alertas sobre possíveis efeitos prejudiciais da comunicação móvel.
Um desses avisos veio com a notícia de que um homem de 31 anos foi recentemente internado para se tratar de um “distúrbio de vício em internet”, por causa de seu uso excessivo do smartphone.
Relação normal ou patológica?
Casos como esse levantam outras questões: com que frequência suas mãos se mexem involuntariamente com a intenção de pegar seu celular ou de alcançar o lugar onde você normalmente o deixa? Como você reage ao som de cada nova mensagem – ou à ausência dele?
Não são perguntas com respostas definitivas.
Traçar o limite entre hábito e patologia significa decidir o que queremos dizer com os termos “normal”, “saudável” e “aceitável”.
E se a tecnologia excede em algo, é justamente em mudar velhas normas rapidamente.
Passei anos tentando avaliar nosso relacionamento com a tecnologia e ainda me vejo sendo puxado em duas direções diferentes.
Por um lado, como disse o filósofo Julian Baggini, “o homem pode estar mudando, mas em muitos aspectos ele continua o mesmo”. Podemos ler romances da Grécia Antiga e compreender quando o autor fala de raiva, paixão, patriotismo e confiança, por exemplo.
Por outro lado, as tecnologias digitais significam que as relações com os outros e com o mundo foram estendidas e ampliadas para um nível nunca antes experimentados.
Como argumentam filósofos como Andy Clark e David J. Chalmers, a mente é uma colaboração entre o cérebro na cabeça e equipamentos como o telefone nas mãos. O “eu” é um sistema complexo que envolve as duas coisas.
É esse impacto exponencial de tecnologia da informação que representa o maior problema para tudo o que julgávamos ser normal, equilibrado, autoconhecido e auto-regulado.
Vivemos em uma era em que nossas patologias são aquelas do excesso.
Dando um tempo
Será que precisamos de uma desintoxicação? Bem, isso não necessariamente funciona, nem para a saúde física nem para a saúde mental.
O melhor é encarar os fatos e começar a aproveitar a intimidade de um relacionamento que só tende a ficar cada vez mais próximo: aquele entre os cérebros de cada indivíduo e as redes de automação que estão sendo tecidas entre eles.
Afinal, estamos despejando nossas horas e minutos não apenas em uma tela, mas sim na mais complexa e abrangente rede de mentes humanas que já existiu, cada uma mais capaz do que o computador mais rápido.
Se fico fascinado, impressionado, superenvolvido, distraído e deliciado com tanta frequência, é por que há outras pessoas lá fora peneirando e refratando esse mundo de informações de volta para mim.
Só conseguirei mudar isso se puder encontrar outras pessoas com quem posso formar novos hábitos e novos modelos de funcionar.
Casos como esse levantam outras questões: com que frequência suas mãos se mexem involuntariamente com a intenção de pegar seu celular ou de alcançar o lugar onde você normalmente o deixa? Como você reage ao som de cada nova mensagem – ou à ausência dele?
Não são perguntas com respostas definitivas.
Traçar o limite entre hábito e patologia significa decidir o que queremos dizer com os termos “normal”, “saudável” e “aceitável”.
E se a tecnologia excede em algo, é justamente em mudar velhas normas rapidamente.
Passei anos tentando avaliar nosso relacionamento com a tecnologia e ainda me vejo sendo puxado em duas direções diferentes.
Por um lado, como disse o filósofo Julian Baggini, “o homem pode estar mudando, mas em muitos aspectos ele continua o mesmo”. Podemos ler romances da Grécia Antiga e compreender quando o autor fala de raiva, paixão, patriotismo e confiança, por exemplo.
Por outro lado, as tecnologias digitais significam que as relações com os outros e com o mundo foram estendidas e ampliadas para um nível nunca antes experimentados.
Como argumentam filósofos como Andy Clark e David J. Chalmers, a mente é uma colaboração entre o cérebro na cabeça e equipamentos como o telefone nas mãos. O “eu” é um sistema complexo que envolve as duas coisas.
É esse impacto exponencial de tecnologia da informação que representa o maior problema para tudo o que julgávamos ser normal, equilibrado, autoconhecido e auto-regulado.
Vivemos em uma era em que nossas patologias são aquelas do excesso.
Dando um tempo
Será que precisamos de uma desintoxicação? Bem, isso não necessariamente funciona, nem para a saúde física nem para a saúde mental.
O melhor é encarar os fatos e começar a aproveitar a intimidade de um relacionamento que só tende a ficar cada vez mais próximo: aquele entre os cérebros de cada indivíduo e as redes de automação que estão sendo tecidas entre eles.
Afinal, estamos despejando nossas horas e minutos não apenas em uma tela, mas sim na mais complexa e abrangente rede de mentes humanas que já existiu, cada uma mais capaz do que o computador mais rápido.
Se fico fascinado, impressionado, superenvolvido, distraído e deliciado com tanta frequência, é por que há outras pessoas lá fora peneirando e refratando esse mundo de informações de volta para mim.
Só conseguirei mudar isso se puder encontrar outras pessoas com quem posso formar novos hábitos e novos modelos de funcionar.
Replicado deste endereço: DCM
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