José Carlos Peliano
Os críticos do país não usam óculos, resistem ou não querem ver direito, embora haja casos que merecem internação definitiva para recuperação ocular e mesmo cegueira. Não só da oposição política propriamente dita mas da midiática também. Enxergam qual país? Qual deles é o que vale?
Falar mal do país virou tônica diária dos oposicionistas. Como prato principal e sobremesa. Nem os cafezinhos nos intervalos do trabalho escapam. O país para eles afunda em corrupção e economia fraca, decadente.
Bom, mas disso tudo já sabíamos, infelizmente, desde o final do primeiro governo de Dilma. O pior é que não se cansaram, nem se cansam, querem ou ganhar no tapetão ou criar dificuldades diárias, permanentes, até secar as expectativas de aposta política e recuperação econômica.
Tentaram bandeiras, faixas, panelas, reportagens falsas, notícias mentirosas, denúncias sem provas, samba do crioulo doido como diria Stanislaw Ponte Preta nos idos dos anos 60. A baderna política na busca de perdurar imagens caricatas do governo eleito democraticamente.
O pior é que não só deturpam a realidade. Não enxergam como convém com nenhum dos olhos o que ocorre no país tampouco no vizinho que tanto adoram, onde mora o Tio Sam. Diria minha avó, para que enxergar direito se eles querem mesmo é ver errado?
Pois bem, enquanto já caem de pau sobre a performance do PIB brasileiro no 1o trimestre desse ano, com queda prevista de 0,5% em relação à leve alta de 0,1% no 3o trimestre de 2014, os EUA registraram queda de 0,2% diante de alta de 2,2% nos mesmos períodos (fonte: Federal Reserve, o banco central norte-americano).
Desaceleram ambas as economias, tendo sido o tombo mais acentuado nos EUA. O Brasil está pelo menos de farol baixo desde a 2a metade do ano passado por várias razões, inclusive pela pressão política dos empresários nacionais sobre a política econômica como tentativa de reversão do quadro sucessório.
A mesma fonte norte-americana de informação indica que ocorre naquele país um período de estagnação econômica após o curto surto de recuperação, ao qual se apegaram muitos países em dificuldades e que agora não sabem bem para onde caminhar.
As exportações recuaram nos EUA, o que mostra a menor procura do setor externo: China em ritmo menor de crescimento, a Zona do Euro pior, às voltas com a austeridade, e os emergentes boiando meio que na expectativa. Já o consumo interno igualmente volta atrás, o que revela a atenuação dos ganhos de renda da população americana.
Guardadas as devidas e honrosas proporções, fenômeno semelhante ocorre no Brasil, apimentado ademais pela quadra difícil dos embates jurídicos com relação aos desvios na Petrobras, o resultado do pleito presidencial ainda atravessado na garganta da oposição e o ataque feroz e diário da mídia desde o ano passado. Qualquer economia sofreria o mesmo tranco.
O Bureau do Censo estadunidense informa que a população que vive abaixo do nível de pobreza de lá está em torno de 14,5% ou 45 milhões de pessoas. Como se pode imaginar que a meca do capitalismo moderno apresenta quadro tão alarmante de pobreza? Pois é o que ocorre, o que os arautos do american way of life não querem ver, se emudecem ou olham de revés.
No Brasil**, em fins de 2013, a população em estado de pobreza era de 8,8% e em estado de extrema pobreza 4%, ou 12,8% na soma, cerca de 26 milhões de pessoas. A comparação é imperfeita porque a renda limite de lá é bem superior, mas o que vale são as condições vigentes em cada país, quanto ao custo de vida, as necessidades básicas e as oportunidades de ascensão social.
Daí o tamanho da pobreza aqui ser pouco mais da metade dos EUA. Não adianta o contra-argumento de que no limite de lá caberiam muito mais brasileiros porque os ricos daqui igualmente não chegariam aos pés dos de lá. Tudo relativo.
A grande diferença, contudo, está no fato de que nos EUA o contingente pobre aumentou, enquanto aqui no país ele declina. De 2006 a 2014 nos EUA o nível de pobreza veio de 12,3% a 14,5%, sem falar no contingente de sem teto que aumenta cada vez mais nas ruas das metrópoles. Enquanto no Brasil vem de 22,6% a 12,8% no mesmo período. Isso mostra que a política econômica brasileira privilegiou a população mais necessitada, enquanto nos EUA o benefício ficou para os abastados.
Os bons reflexos da economia chegaram ao custo da cesta básica no país ajudando a recuperação da renda real dos pobres. A relação custo da cesta básica/valor do salário mínimo evoluiu de forma descendente desde dezembro de 1995 até dezembro 2014. De 91,5% a 44,9% em São Paulo e de 72,7% a 35,6% em Fortaleza.
A grande dificuldade de recuperação estadunidense em relação ao Brasil, no que se refere ao mercado interno, sem depender da evolução das transações com o exterior, é o fato de que a população trabalhadora de lá tem um peso mais acentuado para as condições do país.
Em tempos recentes a criação de empregos americanos tem sido nos setores urbanos de comércio e serviços, onde os salários são menores. Daí para que a economia se expanda há que se criar mais e novos empregos com salários maiores, o que vai exigir projetos de médio e longo prazos nos setores industriais e de alta tecnologia. Vai demandar tempo.
Aqui no Brasil nem tanto. Um reforço ao mercado interno vai consolidar o que já existe, especialmente em relação aos trabalhadores com menores salários. Com a expansão de projetos de infraestrutura o impulso fica por conta dos setores de bens de capital e intermediários, que geram valor e reproduzem mais oportunidades de negócios, renda e emprego através do chamado efeito multiplicador dos investimentos.
De onde virá o impulso gerador? O primeiro ministro chinês anunciou esta semana a intenção da China investir US$ 53 bilhões no país em infraestrutura, exatamente a área que o governo federal anunciou como prioritária para expansão de projetos.
Além do banco dos BRICS com recursos para a mesma área e correlatas, que deve finalmente ser operacionalizado mês que vem em reunião na Rússia. Outros bilhões virão do Pré-Sal apesar da pressão de opositores que querem abrir o setor para a combalida economia americana.
Mas isso só será bem sucedido e em pouco tempo caso o ministro da Fazenda não segure mais e indevidamente as rédeas da economia brasileira. Outro da turma dos que precisam enxergar melhor o que se passa aqui e lá fora.
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José Carlos Peliano é colaborador da Carta Maior.
**Dados do Brasil são de Vinte Anos de Economia Brasileira 1995/2014, Gerson Gomes e Carlos Antônio Silva da Cruz, Centro de Altos Estudos Brasil Século XXI.
Texto original: CARTA MAIOR
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