quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

CONTRADIÇÕES E PERSPECTIVA DE CRISE


A gigantesca massa de recursos que se movimenta na área financeira, praticamente toda desregulamentada, se comporta hoje, como destacou o Financial Times (apud Chesnais, 1996, p. 238), como polícia, júri e juiz das atividades econômicas mundiais. Tem a capacidade de tornar inócua a política monetária dos Bancos Centrais tanto dos países centrais quando dos países periféricos que se envolveram na armadilha da globalização financeira, e ainda interferir na política macroeconômica das nações, afetando o nível da atividade econômica, o investimento produtivo, as políticas sociais e o mercado de trabalho.

A globalização financeira representou para os povos em geral e para as nações periféricas em particular uma enorme transferência de recursos do setor público para o capital financeiro especulativo, pçla privatização de grandes empresas públicas e sua venda a preço irrisórios para o setor privado, ampliando assim a desnacionalização nos países da periferia, e o aprisionamento das empresas produtivas na lógica da especulação. O domínio do capital especulativo provocou também a desaceleração do ritmo de crescimento da economia mundial, resultando na queda dos salários e no empobrecimento geral da população. Entre 1966 e 1973 o crescimento médio foi de 5,2%, enquanto que entre 1991 e 1999 foi de apenas 2,8% (Beinstein, 2001).

Um dos aspectos mais evidentes da globalização financeira é o fato de que, quanto mais aumentam os negócios especulativos, mais cresce a criatividade e a agressividade dos mercados no sentido do auto-crescimento do seu capital. Um dos principais fatores que explica esse processo é a rentabilidade rápida e elevada que as instituições obtêm em seus negócios. Enquanto a atividade produtiva leva um tempo maior para a maturação e retorno do investimento, um especulador hábil pode ganhar em um dia o mesmo que ganharia em um ano no setor produtivo.

Como pudemos também constatar, a massa de recursos na esfera financeira atingia em 2005 cerca de US$118 trilhões, mais de duas vezes o PIB mundial, e os negócios nessa órbita continuam multiplicando-se como cogumelos após a chuva. No entanto, a ousadia especulativa traz consigo alguns elementos de grande fragilidade: a maior parte desses recursos que circula na órbita especulativa não tem lastro na economia real, são puros símbolos escriturais, fictícios, que crescem extraordinariamente na euforia e se esterilizam com uma velocidade ainda maior nos períodos de crise. Além disso, a interdependência dos mercados e a velocidade das comunicações têm a capacidade de irradiar com extraordinária rapidez as crises de uma praça financeira para outra, podendo levar a uma onda de pânico nas finanças globias, fato que viria acelerar ainda mais uma eventual crise financeira.

Essa dinâmica do capital financeiro especulativo se assemelha à lenda de Ícaro, mito grego, que buscava a qualquer custo alcançar o sol, mas quanto mais ele se aproximava, mais pr´poximo ficava da tragédia. Voando com asas de cera, à medida em que se aproximava do sol suas asas se derretiam, até o ponto em que se romperam e o nosso Ícaro desabou no mar...

O deslocamento sem precedentes entre a órbita financeira e a esfera produtiva levará inevitavelmente a uma crise profunda do capital, até mesmo porque a massa de mais-valia criada globalmente no sistema produtivo é insuficiente para remunerar as necessidades de rentabilidade da especulação financeira. Portanto, quanto mais capitais fictícios ampliarem seus negócios na esfera especulativa, mais débil e mais próximos da crise estará o sistema capitalista. Em outras palavras há uma crise sistêmica em curso, como já pode ser observado desde o crash de 1987.

Geralmente, a multiplicidade extraordinária de informações que recebemos, tende a criar nas pessoas uma preocupação fragmentada do mundo, mas se refletirmos cm mais cautela e agregarmos os fatos relevantes da conjuntura poderemos ver que a crise geral do sistema passou a ter não só maior consistência, como sua gravidade vem se acentuando. O primeiro grande sinal vermelho foi a crise do México em 1994. Como se tratava de um país em que os bancos dos Estados Unidos estavam bastante expostos e ainda pelo fato de ser fronteira estadunidense, não foi difícil socorrê-lo ou mais precisamente os especuladores que por lá se aventuraram. Posteriormente veio a crise asiática, agora envolvendo não mais um país, mas uma região inteira. Esta crise contaminou posteriormente a Rússia e levou pânico aos mercados financeiros mundiais. A seguir podemos registar a crise cambial no Brasil e o colapso do Plano Real, além da derrocada da Argentina que, em tremos prospectivos pode configurar um cenário antecipado da crise econoômica Global. Posteriormente, ocorreu a crise da chamada nova economia, agora no coração do sistema, na qual foram esterilizados cerca de US$ 9 trilhões. Estes são indícios de uma grande instabilidade sistêmica e que apontam no sentido de que hoje o grande capital está muito mais em perigo que em 1929.

O processo de financeirização da economia ou instituição do rentismo é uma expressão degenerada da acumulação de capitais e demonstra mais uma vez o parasitismo da burguesia. A “valorização” da riqueza pela via financeira cria contradições entre a velocidade de expansão da órbita financeira e o crescimento do setor produtivo. Como sabemos, a defesa da riqueza pela via financeira é uma aventura sem futuro, pois haverá um momento da ruptura dessa valorização artificial, de forma a compatibilizá-la com a economia real, o que deverá trazer dramáticas consequências para os especuladores e para a ordem econômica capitalista. (Costa, 1993, pp. 14-15).

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TEXTO RETIRADO DO LIVRO
COSTA, Edmilson, A Globalização e o Capitalismo Contemporâneo. Editora Expressão Popular – São Paulo - 2008

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