Para compreendermos o ciclo de mudanças de fundo operadas na vida socioeconômica contemporânea com a globalização, é necessário enfatizar a importância da nova ideologia do grande capital como instrumento especial de consolidação de sua hegemonia mundial. Nenhum sistema se sustenta se não estrutura um corpo de idéias que o justifique e o viabilize social e politicamente. Neste sentido, o grande capital, diante da falta de uma ideologia para o mundo globalizado preferiu retornar ao estatuto ideológico do século 18, buscando adaptá-lo às novas condições de economia globalizada. Por isso o prefixo neo(novo) acrescentado da velha ideologia liberal.
Os apologistas da globalização estruturaram a partir de alguns fundamentos básicos: o mercado como instrumento regulador da vida social, a iniciativa privada côo operadora do sistema, e o Estado mínimo desregulado como instrumento de garantia da propriedade e dos contratos. O mercado seria uma espécie de entidade mítica, um demiurgo capaz de regularem desde as trocas de mercadorias nas mais distantes aldeias até o comércio internacional, passando pela oferta e procura de trabalho, oferta e procura de saúde, de previdência social, educação, lazer, entre outros.
Como instrumento mítico, impessoal e apolítico, teria a capacidade de harmonizar os conflitos de interesses, a liberdade de trocas e os interesses coletivos. O Estado, ao se retirar da economia, e vender as propriedades públicas para a iniciativa privada, passaria a cuidar das funções que lhes seriam específicas: proteger os contratos privados, promover os mercados competitivos, garantir a propriedade. Com a iniciativa privada operando os instrumentos do sistema, haveria mais competição e maior eficiência econômica.
Esses postulados, que passaram a ser conhecidos como neoliberalismo representam a síntese ideológica da globalização. Funcionam como uma espécie de gerenciador ideológico no plano político, econômico, social e cultural dessa nova fase da globalização. Funcionam como uma espécie de gerenciador ideológico no plano político, econômico, social e cultural dessa nova fase do capitalismo. Apesar de primitiva, a ideologia neoliberal conseguiu uma atração espantosa não apenas do senso comum, mas em todas as camadas sociais das sociedades capitalistas. Irradiada à exaustão pelos meios de comunicação nos quatro cantos da terra, esta ideologia penetrou no âmago da consciência das pessoas, desde o mais simples cidadão às mais sofisticadas elites financeiras. Quebrou valores e tradições longamente estabelecidos, tais como a solidariedade, a ética nas relações sociais e econômicas, a busca de soluções coletivas para os problemas humanos, as culturas regionais.
Com a retaguarda da mídia, o neoliberalismo realizou um intenso processo de manipulação, procurando distorcer o significado das coisas e até mesmo as palavras de ordem da esquerda, além de manipular a linguagem e reduzir os fenômenos socioeconômicos à sua aparência (Petras, 1997). Buscou ainda estimular os sentimentos mais atrasados das massas, revigorando preconceitos, exacerbando o xenofobismo, de forma a impor o individualismo mais mesquinho e a lógica do mercado e da iniciativa privada como normas para a vida social. Diariamente, o jornal, o rádio e a televisão realizaram uma batalha ideológica contumaz no sentido de transformar o neoliberalismo em referência para o mundo de vida da humanidade, de forma a que o grande capital tenha espaço aberto para atingir seus objetivos estratégicos.
A título de exemplo, a desregulamentação da economia nas privatizações e a ofensiva contra os direitos e garantias dos trabalhadores são difundidas como reformas modernizadoras, O corte nos gastos públicos, o aperto no crédito, a retirada do Estado da economia são apresentados como ajustes estruturais e a própria palavra liberdade, tão cara as forças de esquerda, especialmente na América Latina, é manipulada para servir as interesses do grande capital (Petras, 1997). Até mesmo invasões a países soberanos, como ocorreu na Yusguslávia e no Iraque, é justificada em nome dosa direitos humanos e da democracia.
No que se refere à política propriamente dita, o neoliberalismo não tem nenhum escrúpulo. Desde que o governante cumpra os objetivos do capital financeiro especulativo dos países centrais, esses dirigentes, por mais corruptos e desmoralizados que sejam, são tolerados e seus governos defendidos em fóruns internacionais e na mídia. Assim, o neoliberalismo pode se utilizar de um bêbado moribundo na antiga |União Soviética, como Yeltsin; um dançarino de tango brega, como Menem na Argentina; um nissei histriônico e fascista, como Fujimori no Peru; um corrupto sofisticado, como Salinas de Gortari, no México; ou ainda um intelectual que deu adeus ao proletariado, como Fernando Henrique Cardoso, no Brasil.
Os neoliberais podem ser considerados hoje os fundamentalistas do Ocidente, tendo em vista que, para estes, não importa os meios e os métodos empregados para atingir seus objetivos. O que importa mesmo é garantir a hegemonia neoliberal em todos os países. O dirigente que não se enquadrar na nova ordem é satanizado, desmoralizado internacionalmente e, na maioria das vezes, destituído do poder – pelas armas, pelo poder econômico ou pelo poder manipulador dos meios de comunicação. O neoliberalismo busca também desmantelar o mais rapidamente possível tudo o que foi construído no período anterior à globalização. Essa ânsia para fazer o trabalho o mais rápido possível está na raiz da intolerância e da agressividade com que os governos dos países centrais, especialmente os Estados Unidos, procuram atingir e desqualificar seus adversários.
No entanto, se analisarmos pormenorizadamente, poderemos detectar uma enorme insegurança entre os defensores dessa ideologia, talvez pelo fato de que esta doutrina sempre que é confrontada com o real, perde a substância. Um balanço do neoliberalismo nestes últimos 25 anos pode ser considerado um desastre para a humanidade, tanto em termos econômicos, sociais, políticos quanto ecológicos. Em todos os países em que implantado, ocorreu a concentração de renda e aumento da pobreza; o mundo se tornou mais instável e as crises econômicas, sócias e políticas mais constantes, os trabalhadores perderam direitos e garantias conquistados há séculos, precarizou-se o trabalho e reduziram-se os salários. Só o grande capital, e os especuladores em especial, podem comemorar o advento do neoliberalismo.
Valie ressaltar, entretanto, que o conjunto das mudanças de fundo operadas pelo neoliberalismo na sociedade contemporânea só foram possíveis porque ocorreu, a partir do final da década de 1970, e posteriormente com a eleição de Regan e Tatcher, respectivamente nos Estados Unidos e na Inglaterra, uma mudança quantitativa na composição das classes dominantes dos países centrais. O velho bloco de poder ligado ao antigo capitalismo monopolista de Estado, cujo poder se consolida a partir dos anos 1930 nos Estados Unidos e, especialmente após a II Guerra Mundial, foi substituído no centro do poder da Tríade Imperial (EUA, EU, e Japão) por um novo bloco de forças sociais mais agressivas e mais reacionárias.
Estas forças subordinaram política e economicamente todos os outros setores da burguesia e impuseram a nova ordem mundial, baseada no neoliberalismo, como forma de organização socioeconômica da sociedade e o rentismo como instrumento particular de auto-acrescentamento do capital, aprisionando inclusive o sector produtivo e o Estado e se orçamento à lógica da especulação financeira. Este novo bloco no centro do poder mundial, buscando configurar o mundo à sua imagem e aplicando uma espécie de vingança histórica de classe contra os trabalhadores.
TEXTO RETIRADO DO LIVRO
COSTA, Edmilson, A Globalização e o Capitalismo Contemporâneo. Editora Expressão Popular – São Paulo - 2008
Um texto colido a dedo...
ResponderExcluirMuito bom.
Saúdo-o. Luta - Paz e Pão, Alex Prado.
São textos como esse que todos deveriamos lê e refletir.
ResponderExcluirMuito bom e educativo, pena que a burguesia não le e se le só serve para se instrumentalizar,entrando e usurpando abertamente outras sociedades em nome da "DEMO" cracia.
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