No dia 1º de junho de 2001 tinha início racionamento de energia elétrica para a indústria no Brasil. Três dias depois, teria início, também, o racionamento residencial. Essas medidas do governo Fernando Henrique Cardoso durariam até 1º de março do ano seguinte, perfazendo nada mais, nada menos do que NOVE MESES de economia forçada de energia aos brasileiros.
E de gastos muito, muito maiores com a tarifa da energia.
A manchete principal de primeira página do jornal Folha de São Paulo naquele 1º de junho do penúltimo ano do governo FHC, era asséptica: “Oferta de energia será crítica até 2003, diz BNDES”. Havia ainda outra manchete, agora com pouco destaque, sobre a questão racionamento: “Começa hoje para as indústrias o racionamento de energia elétrica”.
Detalhe: os colunistas de política da Folha fugiram do assunto apagão” no 1º dia de um racionamento de energia que paralisaria a economia do país, aumentando o desemprego e a inflação devido à redução da atividade de uma indústria que teve que adequar a sua produção à oferta de energia existente, sendo obrigada, inclusive, a demitir empregados por falta de capacidade produtiva. Algumas dessas indústrias quebraram por falta de energia para produzir.
Na página A2 daquele 1º de junho de 2001, destinada às opiniões “da casa”, os editoriais tratavam da economia Argentina – que já caminhava para o desastre –, de atacar Antonio Carlos Magalhães – neo inimigo de FHC – e dos “Horrores do cigarro”, e os colunistas tratavam da política miúda.
Na página A3, o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello pedia “Menos leis, mais compostura” (defendendo a própria corporação) e um “paga-pau” qualquer discorria sobre “a extensa obra produzida pelo brilhante sociólogo Fernando Henrique Cardoso”.
Finalmente, na coluna de leitores, os assuntos foram saúde (versão do governo FHC), mais ACM (inimigo de FHC), “TV-arte” (fosse isso o que fosse), Anistia (puxamento de saco do jornal por um leitor), Planejamento (mais bajulação do jornal) e Bienal e Biomassa (e dá-lhe bajulação).
Na edição da mesma Folha de São Paulo de quase uma década depois, no dia seguinte ao blecaute de até quatro horas ocorrido no Nordeste no dia anterior, porém, o tom é de catástrofe iminente. Manchete de primeira página anuncia neste sábado, quase em pânico: “Total de apagões graves no país quase duplica em 2 anos”.
Além de textos críticos ao governo nas páginas A2 e A3, que quase uma década antes não compareceram no dia em que o país mergulhava em uma medida draconiana que tantos sacrifícios iria impor aos brasileiros, na edição deste sábado, 5 de fevereiro de 2011, há OITO matérias no caderno Cotidiano tratando do assunto, todas aumentando o pânico sobre o um problema episódico que ninguém ousa afirmar que irá impor um único sacrifício ao país e à sua economia além dos que causou na hora de sua ocorrência.
Essa situação de estabilidade do sistema elétrico nacional se torna clara em rápida análise do site do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que informa dados bem eloqüentes, como o de que a energia armazenada mensalmente, por exemplo, no Sudeste e no Centro-Oeste do Brasil em 2001, foi, em números redondos, de 45.000 MWmes, em média, enquanto que em 2010 foi de 125.000 MWmes.
Produção e demanda de energia no país, portanto, estão equilibrados. O aumento do número de interrupções de energia a que se refere o jornal que se preocupa mais com a situação de fornecimento de energia elétrica hoje do que em 2001 se deve ao aumento exponencial da demanda aliado à característica histórica do Brasil de levar energia de uma região a outra por meio de linhas transmissão, sempre sujeitas a acidentes.
Não falta energia ao país. Nenhum especialista na matéria que possa ser considerado sério e isento dirá que há uma situação preocupante.
Mas é claro que a Folha conseguiu um “especialista” que dissesse o que queria ouvir. Como não poderia deixar de ser, um membro do setor de energia do governo FHC, alguém envolvido no RACIONAMENTO que durou NOVE MESES e que agora vê com “preocupação” o segundo grande BLECAUTE no país após 2001/2002. Dois eventos que duraram, ao todo, nem DEZ HORAS.
Diante dos fatos supracitados e da gritaria da mídia por um problema de interrupção de fornecimento de energia – que, segundo o governo, foi absolutamente episódico e ao qual está sujeito todo o país que tenha a característica do nosso de transmissão de energia de uma região a outra –, cabe perguntar: de que “apagão” estão falando esses caras-de-pau?
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